Pela primeira vez minha inteligência resolveu divergir de Santo Tomás; talvez para agradar milha filha. Certa vez, minha amada Aurora com seu franciscanismo inerente, questionou-me sobre a perduração das almas dos animais na Jerusalém Celeste. Pobre Aurora, ainda bem que questionou a mim e não ao Compêndio de Teologia.
Santo Tomas diz-nos que animais e plantas não terão seus corpos renovados após a ressurreição, pois tanto um quanto outro existem para suprir a corruptibilidade de nossos corpos - que na renovação tornar-se-ão incorruptíveis, assim não mais necessitaremos deles - e ainda mais, nem em animais nem nos vegetais ou mesmo nos mistos desses, há se quer partes incorruptíveis; o que torna injustificável sua renovação. Seriam renovados somente os quatro elementos, os corpos celestes e claro, nós.
A justificativa para a renovação dos quatro elementos são boas, pois esses são constitutivos do homem e ainda são incorruptíveis no todo, mas corruptíveis nas partes, assim como os corpos celestes. E nesse ponto pouco diferimos deles, pois somos também incorruptíveis, só que ao contrário o somos numa parte e não no todo; nossa alma racional é incorruptível, todo o resto de nossa constituição é corruptível.
Mas qual o problema? Tem algo que vorazmente me inclina a não aceitar que na renovação nossos irmãos vegetais e animais não estarão conosco na infinitude. Vá lá, tudo bem, não há nada de incorruptível neles, mas hoje sabemos que igualmente não há nada de incorruptível nos corpos celestes e assim percebemos que o calcanhar de Aquiles do frei Tomás fora a já superada ciência astronômica de sua época. Pois, com o que sabemos hoje sobre os astros, teríamos de rebaixar a leitosa e fascinante luz das estrelas, a mais um ornamento na criação. Pensemos, não será necessário, ao menos a que se refere ao conhecimento atual das ciências naturais, atualizar o tomismo? Bom, se é ou não, é inevitável que o façamos em relação a incorruptibilidades dos astros.
Entretanto, como em um fio de esperança, diz-nos o sábio: "os astros servem ao homem porquanto sua grandeza e beleza nos revelam a existência do Criador". Será que só por essa serventia magnânima, sabendo da corruptibilidade dos errantes, Santo Tomás afirmaria a sua renovação na ressurreição? Pois bem, se o fizesse, não teria motivos para não dignificar igualmente toda a natureza.
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